quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

A ILUSÃO

Foi ontem à hora de almoço. Eu e a Lúcia estavamos a conversar sobre a nossa relação com a comida. As dietas que fizemos ao longo da vida. E o impacto que isso teve no sistema emocional. E sobre o papel da doçura na nossa vida. E que eu sou doce mas não deixo o doce entrar.

E a Lúcia disse-me: O problema está em que tu sabes dar mas não sabes receber. E começou a abraçar-me e eu ia abraçá-la também, mas nesse momento ela puxou os meus braços para baixo. Não, tu só recebes. Recebe este abraço, só. E ficamos ali, assim, no meio da cozinha. Eu só a ser abraçada sem abraçar. Muito tempo. E comecei a chorar.

Nunca tinha recebido um abraço sem abraçar.

Porque não me abro para essa possibilidade. Porque quando abrimos o coração, tanto pode vir o abraço, como não. E a possibilidade de o abraço não vir desencadeia uma dor que eu não "queria" voltar a sentir. E quanto mais fugi dela mais ela me perseguiu. Por isso abraço tanto. Por isso dou tanto. Se for eu a dar não fico à espera que me dêem e não corro o risco que não me dêem.

E por isso Jesus me disse, em Agosto:

Se depois desta dor de teres aberto o coração e teres recebido uma facada em vez de um abraço, se depois desta dor conseguires manter o coração aberto, estás a ser mais destemida do que o mais destemido dos guerreiros.

É por causa do medo desta dor que fechais os corações. E quem não abre não recebe.
Podes receber uma facada. Mas também podes receber um amor incondicional e inesgotável.


Como a tendência ao longo da vida, sempre foi fechar, porque quando me sentia ferida não conseguia manter o coração aberto, criei uma carência que eu sempre tentei compensar com comida. Ainda o faço, inconscientemente. Já sei, muito bem, que não há nada na Terra que possa preencher o meu vazio. Nem pessoas, nem comida, nem coisa nenhuma. Nada. Só a energia de Luz. Só a energia da minha alma. Sei muito bem e treino muito isso. Mas ainda me continuo a iludir muitas vezes. Ainda reajo muitas vezes como se alguma coisa, como se a comida, ou como se alguém me pudesse devolver a energia lá de cima. Como se me pudesse devolver o sentimento de unidade e de absoluto. É-me mais difícil não me iludir com as pessoas principalmente quando reconheço a energia delas, a alma delas. E fico à espera que a energia delas cá em baixo seja como é lá em cima, e me devolvam as emoções lá de cima. Ora, se nem a minha é, porque é que a delas há-de ser?

E isso faz-me lembrar do João, um menino de 5 anos que eu costumava atender no Porto e que me oferecia sempre desenhos de jóias com as mais lindas pedras preciosas...eram as jóias super brilhantes que ele via lá em cima...e que costumava dizer à mãe quando ela lhe ralhava: "Enganaste-me bem. Quando te escolhi lá em cima para minha mãe tu eras tão linda e tão doce...Muito diferente de cá em baixo."

Quando no Sábado fui dar um passeio pelo jardim ao lado de casa e encontrei o "Banco do Amor"
fiquei com os olhos cheios de lágrimas por estar sózinha naquele momento. Por não ter com quem o partilhar. E Jesus disse-me:

Sabes que se estivesses com alguém, provavelmente nem tinhas encontrado este banco? Porque não terias tempo para fazer o que te apetecia e vires ao acaso, e vires espreitar estes recantos do jardim que ainda nem conhecias?

Sabes que se estivesses com alguém provavelmente nem estavas a fotografar e não ias partilhar estas fotografias com mais ninguém?

Sabes que se estivesses com alguém provavelmente não ias estar disponível? Nem para ti, nem para os outros? Estarias só para essa pessoa? Com a ilusão que ela te preenchesse e te devolvesse a plenitude lá de cima.

Sabes isso não sabes?

Tens que aprender a ser livre sozinha, para depois poderes desfrutar disto tudo acompanhada. Sem te perderes no outro. Sem te prenderes ao outro. Sem dependeres do outro.


Sim, essa sempre foi a minha maior ilusão. Sentir que precisava do outro. E como quem se ilude se desilude...A dor da perda e da desilusão sempre foram as minhas maiores dores. E a desilusão está relacionada com a ferida da minha alma. Por isso atraio para a minha vida pessoas que me provocam as maiores desilusões. Que me iludem sem saber que estão a iludir. E eu iludo-me sem saber que me estou a iludir. E quando finalmente me desiludo tenho que as deixar ir. E ficar sozinha. Até curar a ferida.

Quanto mais estiver consciente disto, menos probabilidades tenho de me voltar a iludir.

E a realidade, sem ilusões, é de que ninguém nem nada nos vai preencher. Vamos amar e ser amados. Uau... Mas não vamos depender para nos sentirmos realizados, plenos, conectados.

E eu estou a aprender a realização, a plenitude, a conexão, sozinha, sem dependências.

E aí, espero, já vou saber receber. E vou poder ser amada. Cá em baixo. E vou poder amar. Cá em baixo. Sem ilusões. E sem medo das desilusões. E sem medo das facadas.

E o Jorge, de tarde, sem saber de nada do que se passou na cozinha, deixou-me um chocolate na secretária...

5 comentários:

Lurdes JC disse...

Que mais te posso dizer a não ser que o texto está muito bom, muito sincero, e a mensagem que transmites é mesmo muito forte.
Deve ter sido de uma sensação interior fortíssima o abraço sem esticares os braços para retribuir. e tudo o mais, deve ser uma sensação de impotência propositada para sentir que receber é a maior dádiva do céu... Que lindo amiga.
bj mto grande
Lurdes Jóia

Essencialma disse...

Este teu texto é especial para mim, muito!
Porque de uma forma ainda mais de perto, essa tua vida, toca a minha...é tão, mas tão bom sentir isso!
Porque desta vez sei muito bem a sensação, porque também vivi isso...é tão difícil, só ficar, e a Lúcia que diga a minha resistência, acho que ainda tentei duas vezes, ela é que não dá trégua... :)
No que diz respeito ao abraço, tem sido para mim uma forma de medir o meu controle, e o receber muito grande, ao ponto de eu tentar ir lá receber, e quando acabava, percebia que só conseguia dar. É também curioso ler agora o teu texto, depois de ter estado com uma amiga, e quando vinha para casa pensava, como eu senti aquele abraço hoje, o ficar só no abraço, e o amor...é tão bom conseguir receber.

E sou tão feliz por fazer parte desse vosso mundo, e de fazerem parte da minha vida...
Amo a Lúcia e ela sabe, tem sido uma pessoa muito, muito importante na minha vida, acompanhado a caminhada, e isso é algo sem valor, inexplicável!
E tu, com esse teu jeito simples, amável, que nos faz sentir tão próximos, fizeste desde o primeiro momento que gostasse de ti, e estou feliz pela evolução da amizade...e vou gostar de te conhecer ainda melhor, quando tiver essa oportunidade.

No que diz respeito ao restante texto, sinto isso a ser-me pedido agora...vou confessar que não gosto, e normalmente nem admito isso para mim, mas torna-se cansativo, criar um relacionamento com as pessoas, e depois ver-me forçada a deixá-las ir...também pensava hoje, eu sei que é apego, e não sei até que ponto não está lá muita ilusão, e acho que o que sinto nos últimos dias, nem muito real é, é só o universo a mostrar que tenho de largar, mais uma vez.
E já estou no Eu aceito!!
E apesar de já ter sentido e sentir, a importância de estar sozinha como tu descreves, é díficil...eu sei, mas necessário.

Beijo muito grande...
E não sei como vamos fazer, mas o melhor é não focarmos no dar...
Eu recebo o teu, tu o meu...
Abraço... se estiveres por lá, talvez no domingo :))

Olinda Cristina disse...

Obrigada Lurdes, obrigada Cláudia!

Tão bom sentir que estamos prósimas!

Beijo e abraço muito, muito, apertado!

Cristina disse...

Doce Olinda,

Adorei o que escreveu! Obrigada!
Muitos beijinhos e um forte abraço! Os abraços que você me dá quando vou á clinica são muito calorosos!
Cristina Perdigão

Olinda Cristina disse...

Cristina, que boa surpresa! Muito obrigada e um grande xi-coração!