quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Texto "O MEU FILHO" com fotos nossas

Porque não te rendes?
Porque não te rendes à tua impotência?
Porque não te rendes a que não podes fazer mais nada senão amar?


Já eram 16h. Estava na praia desde as 13h. À espera de uma indicação do Céu. Deitei-me encostada a uma pedra, no meu lugar preferido. Abrigado das pessoas, do vento, do frio. E fiquei. Adormeci. Acordei. E falava e voltava a falar com o Céu. Fazia perguntas. Só eu é que falava, porque não obtinha resposta nenhuma. Voltei a adormecer. Voltei a acordar. E ao acordar senti uma paz que achei estranha. A paz era tão grande, como se tivesse sido acordada pela brisa do mar...e o silêncio total, o mar tão calmo...achei estranho porque eu tinha chegado lá muito agitada. Sentia a paz, mas não sentia mais nada. Continuava a não ter respostas nem inspiração nenhuma. Estava disposta a esperar tranquilamente o tempo que fosse preciso. Nem vontade tinha de almoçar. Só queria permanecer em silêncio à disposição do Céu, na esperança de receber algo. As perguntas eram sobre o meu filho.

Até que passadas três horas Jesus perguntou porque não me rendia.

Porque não desistia de querer que o meu filho fosse feliz.

Eu pensava que já me tinha rendido.

Porque querer que ele fosse feliz, foi sempre o que eu mais quis.

Depois de compreender que parte de nós é que quer, é que deseja, achei que tinha deixado de querer e de desejar.

E que me tinha apenas concentrado em tentar ser a melhor mãe que eu sou capaz de ser.

Só que estou sempre a cair na "ratoeira". Estou sempre a querer ser a mãe perfeita. Que para mim é a mãe que consegue que os seus filhos sejam felizes.

Desde que nasceu o meu filho foi sempre a minha maior debilidade. A minha maior fragilidade.

Vivi por ele e para ele. Fiz das tripas coração. Virei-me do avesso. Quando adoeceu, pedi ao Céu que trocasse a vida dele pela minha. Que se isso não agravasse o nosso karma, que transferisse a doença para mim. Que me levasse a mim.

Até que o Céu me explicou. Que eu não podia viver a vida dele. E que tinha que viver a minha. E que isso era o que podia fazer de melhor pela vida dele. E eu prometi.

Na verdade, eu já sabia isso em teoria. E até achava que já praticava. Achava que já tinha a minha vida. Mas só percebi que não, quando ele adoeceu. E em respeito por ele e por mim, avancei com a minha vida. Dei-lhe espaço para escolher, vir comigo ou não. Fazia parte do respeito que tinha que ter por ele. E não quis vir para Oeiras comigo. Nunca pensei que fosse capaz de vir sem ele. E se não tivesse estado em risco de o perder, não teria mesmo conseguido vir.

Além da minha dor, tinha o medo. O medo de me criticarem, de me acusarem de ser má mãe, de abandonar o meu filho. Quando me criticam e acusam, como já têm feito, não sabem da coragem que precisei de ter para fazer o que mais me custava. Uma coragem que eu não pensava que algum dia conseguisse ter. E não imaginam que o fiz por amor. Por amor a ele e a mim.

Eu precisava de continuar a criar a minha vida. Não só de ganhar a vida. Não o tinha ainda conseguido fazer pela responsabilidade que sentia em relação ao meu filho. Pelo medo de que se não estivesse completamente focada nele alguma coisa não corresse bem. Pela necessidade de estar por perto para o ajudar. Para o proteger. Para o orientar. Porque o amava tanto que o que mais queria era fazer tudo para ele ser feliz.

Sim, e ele ficou doente apesar de eu ter estado sempre focada nele. Tinha resultado? Não. Não o pude proteger porque não podemos controlar o que não está ao nosso alcance. A felicidade dele não está ao meu alcance. Quanto a isso só posso fazer a minha parte. E a minha parte é ser a melhor mãe que consigo ser. Amá-lo, apoiá-lo e orientá-lo o melhor que consigo. E serei tanto melhor quanto mais feliz e realizada eu estiver. O resto não depende de mim. Transcende-me. Ultrapassa-me. O resto é com ele e com o Céu.

Tantas vezes, ao viver aqui momentos de felicidade, de repente sentia uma sombra:
Falta o meu filho, não está aqui.
E o Céu: Não está porque não quer. É uma escolha dele e tu não podes fazer nada em relação a isso.

Nunca amei tanto ninguém como o amo a ele. É a pessoa mais importante na minha vida. Toda a dor dele me dói a mim. Profundamente. Gostava tanto que ele fosse muito alegre e muito feliz. Ajudo tanta gente a ser mais alegre e mais feliz. Mas a pessoa que eu mais queria tocar, mais queria ajudar, mais queria que fosse mais alegre e mais feliz, não consigo. Pelo menos, não da maneira que eu gostaria.

E por isso Jesus me perguntou hoje: Porque não te rendes?



("Amo-te filho" foi um quadro com cerca de 100x60cm, em acrílico que ofereci ao Zé Miguel no Natal de 2008, só com fotos nossas. Foi realizado pela minha amiga Ana Catarina Esteves Martins.)

Sem comentários: