domingo, 17 de junho de 2012

OUTRA VEZ COMBOIOS

Eu, a Lena e o Jorge íamos de pé. A Lena levava a Mimi ao colo. E eu as minhas mochilas, que pousei no chão. Normalmente há lugares sentados mas com as férias escolares os miúdos vão para a praia e enchem os comboios Oeiras-Lisboa. Um ia a tocar guitarra, e como eu comentei, é bom ir no comboio a ouvir música ao vivo.

A Lena saiu em Algés, ia para nossa casa, mas eu e o Jorge continuamos para Lisboa, para apanhar o comboio para o Porto. O Jorge, a gozar, recomendou-me que tivesse cuidado com o som, para não repetir a cena daquela vez que ia com phones mal ligados ao pc e o volume ia no máximo com toda a carruagem a ouvir. Ri-me e respondi que para além de agora fazer menos viagens, não tenho tido histórias para contar, mais por falta de paciência para estar atenta do que por outra coisa. Refugio-me sempre nas minhas músicas.

Nas portagens (chamemos-lhes assim) da estação do comboio, em que temos que passar o bilhete para as portas se abrirem e sairmos, o meu não passava. Apitava e dava sinal vermelho. Um senhor (chamemos-lhe também assim, mas ele era mais ou menos da minha idade) nem me deu tempo de reflectir sobre o que se estaria a passar. Ofereceu-se logo para me levar com ele. Ou seja se eu me colasse a ele, passavamos os dois juntos. Estranho. Que é que deu ao homem? Mas está bem. Tenho pressa e como não estou a infringir porque tenho o bilhete pago, aceito. Só que o passe dele também não funcionou. Deu sinal vermelho. Passamos rapidamente para a porta da esquerda. Voltei a tentar com o meu bilhete e nada. Ele com o passe dele e nada. Passamos para outra porta mais à esquerda. A mesma coisa. Apre. O Jorge já do outro lado a olhar para nós e a rir-se. Eu já a começar a estranhar muito, porque entretanto tinha que ir muito juntinha ao senhor para tentarmos passar ao mesmo tempo. À quarta vez lá passamos e o homem foi à vida dele, a correr. Vi as costas da t-shirt dele: Rolling Stones. Muito bem.

Despeço-me do Jorge e entro no metro. Reparo num grupo de três raparigas que lá vão. E penso em como a necessidade de sentirem aceites as levas a imitarem-se umas às outras. E penso que isso chega ao ponto de imitarem a voz e forma de falar. Porque uma tinha uma voz muito aguda. E outra falava com uma voz igual. E eu a pensar como é que conseguia imitar a voz daquela maneira, que devia ser um esforço e contrôle constantes. Que até o cabelo era igual, a mesma franja.

Levantamo-nos todas para sair na mesma paragem e é então que finalmente vejo o óbvio! São gémeas. São iguaizinhas porque são gémeas. Têm a mesma voz porque são gémeas!...Iam à minha frente a subir a escada rolante e eu não conseguia evitar sorrir...porque era tão óbvio e evidente que eram gémeas e eu tinha gasto tanto tempo a tecer considerações sobre a rejeição e necessidade de se sentirem integradas nos grupos...

Já no comboio para o Porto sento-me no lugar errado e o dono dele quando chegas diz que não se importa nada de se sentar noutro lugar. Eu peço mil desculpas, que não senhora, que vou para o meu lugar, que é no banco da frente. Atrás de mim, ele não pára de falar ao telefone. Eu ponho os meus phones, porque definitivamente não tenho paciência para as conversas, mas ainda oiço uma rapariga lá à frente a falar com alguém também ao telemóvel, a dizer que tem chamadas grátis e e e pedir-lhe para ficar a falar com ela durante a viagem porque senão é uma seca. Cruzes, credo. Deitar conversa fora, como dizem os brasileiros, durante uma viagem inteira... Enquanto pensava na dificuldade das pessoas ficarem com elas próprias, ao mesmo tempo pensava na minha alegria em poder pôr os phones e viajar para dentro de mim. Dois em um. Viajei para o meu centro e para o Porto.

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