terça-feira, 2 de outubro de 2012

TAXIS E TAXISTAS

Assim que entrei no taxi o motorista virou-se para trás e disse: “Desculpe mas sacos no assento, não.” Atendendo a que o saco que eu tinha pousado era tipo mala, com rodinhas e tudo, respondi que eu é que pedia desculpa, e mudei o saco para o chão. Que as pessoas estavam habituadas a entrar em táxis velhos, tratavam os carros de qualquer maneira, batiam as portas com força. “A senhora reparou como bateu a porta do carro?” Não. ”É que bateu com muita força." Nesse caso peço desculpa mais uma vez. Não me apercebi. ”Sabe quanto é que custam os fechos destas portas? 600 euros. E se a senhora o avariar é a senhora que paga. Não tenha dúvida."

Comecei a achar que não estava para aturar o senhor. Ia pedir-lhe para encostar para eu sair. Mas ponderei. Estava a chegar do Porto, cansada e muito carregada, com sacos e mochila. Já passava das oito da noite. Estava ansiosa por chegar a casa e ainda tinha que apanhar o comboio para Algés no Cais do Sodré. Ficar apeada num sítio qualquer e ter que esperar por outro táxi não me estava a apetecer. Discutir com o senhor, muito menos. Seria como bater no ceguinho. Ainda por cima ele parecia ter bebido um copo a mais. E isso devia ter contribuido para a agressividade e para procurar motivos para discussões. Há pessoas que reagem assim. Resolvi manter-me calada. Mas ele falou sempre. Que há tempos um miúdo se pôs a escrever no couro da porta de trás e a mãe teve que pagar 200 euros. Que dizia que não pagava, mas o patrão dele não perdoou e foi para tribunal e ela não teve outro remédio senão pagar. E outra coisa: naquele táxi nunca mais entrava ninguém com bolos. Que uma rapariga trazia um bolo que se virou e manchou o assento com chantilly. E que o patrão lhe tinha dito que não devia ter deixado entrar. E que agora não entram mais. “Traz bolo? Então, desculpe, mas não entra.” Que sabia que ela não tinha feito de propósito. Que afinal ela também tinha ficado sem bolo. Não resisti e perguntei se o bolo não vinha com caixa. Que sim, mas mesmo assim virou-se todo. Chegamos. Entretanto eu já tinha voltado a um estado de tranquilidade e resolvido que não ia andar ao sabor do humor dos outros e despedi-me com cortesia desejando-lhe bom trabalho. Ele olhou para trás com ar meio surpreendido com a amabilidade.

Enquanto vinha a ouvir este senhor lembrei-me do último taxista, quando estava a fazer o trajecto inverso para apanhar o comboio para o Porto. Teria uns sessenta anos. Entrei e depois de lhe pedir para me levar a Santa Apolónia, perguntei-lhe se chegariamos a tempo de apanhar o comboio das 19.30h. Que teríamos que chegar, respondeu ele. E pôs-se a considerar em voz alta os vários trajectos possíveis para concluir qual seria o mais rápido aquela hora. A luz dos semáforos ficou vermelha e ele começou a pedir em voz alta a olhar para o Céu, que a luz mudasse rapidamente para verde. Como não mudava, pegou na cruz do terço pendurado no espelho retrovisor e apontou-a para os semáforos e pediu por favor. Eu soltei uma gargalhada. Ele respondeu que toda a ajuda era precisa. Tinha escolhido ir por detrás do Terreiro do Paço mas já estava arrependido por causa dos autocarros que não o deixavam passar. Eu estava impávida e serena e até me arrependi por ter provocado no senhor uma “camada de nervos” como diriam na minha terra. A propósito falou-me nas suas raízes nortenhas e acabou por falar no filho e na mulher e no que eles faziam e que idade tinham. Fiquei surpreendida por o único filho ter a idade do meu. Chegamos a tempo e o senhor ficou aliviado.

Ainda a propóso de taxis estou a lembrar-me de um taxista que apanhamos uma vez, eu e uma amiga, que parecia que estava a fazer uma rally pelas ruas de Lisboa. Agarravamo-nos a todos os puxadores e mesmo assim escorregávamos de uma ponta à outra do assento. Perguntei porque é que estava a conduzir assim, que era um bocado assustador e perigoso. Que conduzia sempre assim e por isso só trabalhava de noite. Que já passageiros tinham vomitado e que uma grávida entrou em trabalho de parto apesar de faltar muito tempo para a data prevista, só com o medo. Para não falar no número de passageiros que lhe pediam para parar para poderem sair, quase a desmaiar. E que quando ia ao Porto chegava lá em duas horas.

Felizmente não o voltei a encontrar.

Cheguei a Algés e vi imensos carros estacionados junto ao recinto do Optimus Alive. Perguntei a uns seguranças o que estava a acontecer. Só sabiam que era música africana e só conheciam o nome do Tito Paris. Já se ouvia a música e alguem estava a cantar Cesarea Évora.

Ao chegar à porta de casa é que me lembrei que ia ter que carregar tudo para o 4º andar...vá lá que não me custou quase nada. Estava tão contente por chegar que subi num instante. A Lena e o Rui não tardaram a chegar e senti-me no Céu. Passado um bocado já nos estavamos a rir à gargalhada. Banho, jantar e o brinde do costume. E a kizomba entrava-nos pela casa dentro. Haja alegria.

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